quinta-feira, 26 de abril de 2007

O que é o provincianismo (por Fernando Pessoa, 1928)

"O provincianismo português

Se, por um daqueles artificios cómodos, pelos quais simplificamos a realidade com o fito de a compreender, quisermos resumir num sindroma o mal superior português, diremos que esse mal consiste no provincianismo. O facto é triste, mas não nos é peculiar. De igual doença enfermam muitos outros paises, que se consideram civilizantes com orgulho e erro.

O provincianismo consiste em pertencer a uma civilização sem tomar parte no desenvolvimento superior dela - em segui-la pois mimeticamente, com uma subordinação inconsciente e feliz.O sindroma provinciano compreende, pelo menos, três sintomas flagrantes: (1) o entusiasmo e admiração pelos grandes meios e pelas grandes cidades; (2) o entusiasmo e admiração pelo progresso e pela modernidade; (3) e, na esfera mental superior, a incapacidade de ironia.

Se há caracteristico que imediatamente distinga o provinciano, é a admiração pelos grandes meios. Um parisiense não admira Paris; gosta de Paris. Como há-de admirar aquilo que é parte dele? (…)

O amor ao progresso e ao moderno é a outra forma do mesmo caracteristico provinciano. Os civilizados criam o progresso, criam a moda, criam a modernidade; por isso lhes não atribuem importância de maior. Ninguem atribui importância ao que produz. (…) O provinciano, porém, pasma do que não fez, precisamente porque o não fez; e orgulha-se de sentir esse pasmo. Se assim não sentisse não seria provinciano.

É na incapacidade de ironia que reside o traço mais fundo do provincianismo mental. Por ironia entenda-se, não o dizer piadas, como se crê nos cafés e nas redacções, mas o dizer uma coisa para dizer o contrário. A essência da ironia consiste em não se poder descobrir o segundo sentido do texto por nenhuma palavra dele, deduzindo-se porém esse segundo sentido do facto de ser impossivel dever o texto dizer aquilo que diz. (…)

O provincianismo vive da inconsciência; de nos supormos civilizados quando o não somos, de nos supormos civilizados precisamente pelas qualidades por que não o somos. (…) "

1 comentário:

Anónimo disse...

Vamos dar liberdade à spessoa de pensarem e agirem dentro dos limites quenão prejudiquem uma às outras.
Deve-se permitir que cada um viva do jeito que melhor lhe prouver. O que o texto mostra é exatamente que ao combter o provincianismo estamos sendo prvincianos.
Chega de rótulos. Deixem as pessoas descobrirem seus caminhos.